Análises, Cinema

Pinocchio de Guillermo del Toro – Análise

Pinocchio é um filme animado, de fantasia e musical em stop-motion de 2022 da Netflix, dirigido por Guillermo del Toro (diretor detentor de um Óscar de melhor realizador pelo filme, The Shape of Water, mas também conhecido pelos seus trabalhos dos filmes do género de terror, tais como Pan’s Labyrinth ou Crimson Peak. Para além deste, também é reconhecido por trabalhos como: Blade II, Hellboy, Hellboy II: The Golden Army, Pacific Rim, Nightmare Alley, e mais recentemente coma série Guillermo del Toro’s Cabinet of Curiosities) e Mark Gustafson (estreante na direção) a partir de um argumento de Toro e Patrick McHale (animador, argumentista, compositor e diretor americano, mais conhecido por seu trabalho na série animada Adventure Time). O filme é baseado no design da edição de 2002 de Gris Grimly (artista e contador de estórias americano, que escreve principalmente livros infantis sombrios e whimsical) e do romance italiano de 1883 The Adventures of Pinocchio de Carlo Collodi (autor, humorista e jornalista italiano, conhecido pelos seus contos de fadas).

Pinocchio de Guillermo del Toro teve a sua estreia mundial no BFI London Film Festival em 15 de outubro de 2022, foi estreado nos cinemas selecionados em 9 de novembro de 2022, antes do seu lançamento no canal de streaming Netflix a 9 de dezembro.

Esta animação é estrelada pelas vozes de Ewan McGregor (ator escocês que já possui diversos prémios da indústria do cinema, como Golden Globe Award, Primetime Emmy Award, BAFTA, etc. Do seu trabalho destacam-se os filmes Trainspotting e T2 Trainspotting, a trilogia prequela de Star Wars, Moulin Rouge!, Black Hawk Down, Big Fish, Robots, Angels and Demons, The Ghost Writer, Beauty and the Beast, Birds of Prey entre outros), David Bradley (ator inglês mais conhecido pelos seus trabalhos nos filmes de Harry Potter, Captain America: The First Avenger, Hot Fuzz, etc.), Gregory Mann (jovem ator a dar os primeiros passos no mundo do cinema), Burn Gorman (músico e ator inglês que participou no The Dark Knight Rises, Enola Holmes, Johnny English Reborn, etc.), John Turturro (ator americano que teve papéis nos filmes Five Corners, Crossing, Barton Fink, The Big Lebowski, na franquia deTransformers, The Batman, entre outros), Ron Perlman (ator americano mais conhecido pelos seus trabalhos Alien Resurrection, Hellboy e Hellboy II: The Golden Army, Don’t Look Up, etc.), Finn Wolfhard (jovem músico e ator canadense com papéis nos filmes It e It: Chapter Two, The Goldfinch, The Addams Family, Ghostbusters: Afterlife, etc.), Cate Blanchett (atriz australiana, reconhecida pela Academia de Cinema por 2 vezes, pelas suas interpretações, nas longas-metragens: The Aviator e Blue Jasmine, e por mais nomeações aos prémios, sendo também conhecida por filmes como: Elizabeth, Babel, Elizabeth: The Golden Age, Nightmare Alley, ou como Galadriel na saga de filmes de The Lord of the Rings), Tim Blake Nelson (ator americano mais conhecido pelas suas interpretações nos filmes Minority Report, Holes, Nightmare Alley, Monster, Fantastic Four, The Incredible Hulk, Scooby-Doo 2: Monsters Unleashed, etc.), Christoph Waltz (ator austríaco-alemão, mais conhecido pelos seus trabalhos nos filmes Inglourious Basterds, Carnage, Django Unchained, Alita: Battle Angel, No Time to Die, etc.), Tilda Swinton (atriz inglesa vencedora de um Óscar e de um BAFTA como melhor atriz secundária no filme Michael Clayton, contando também com várias nomeações para prémios da academia Ela participou nos filmes The Personal History of David Copperfield, The Deep End, Vanilla Sky, Constantine, Julia, I Am Love, franquia The Chronicles of Narnia, The Grand Budapest Hotel, The French Dispatch, etc.), entre outros.

O Boneco de Madeira…

Esta animação, transporta-nos inicialmente para a época da primeira Guerra Mundial, onde Geppetto (David Bradley) é um carpinteiro duma pequena aldeia em Itália, onde trabalha o dia inteiro na reconstrução de objetos de madeira que estejam estragados dos aldeões, assim como cria novos para estes quando precisam. Geppetto nesta época torna-se responsável pela construção dum “Cristo na Cruz” em madeira para a igreja da aldeia e para isso conta com a ajuda do seu filho Carlo (Gregory Mann).

Neste trecho inicial, a vida e principalmente a guerra são cruéis com o carpinteiro, destruindo aquilo que ele mais gosta, e assim é-nos mostrado o impacto da Primeira Guerra Mundial na vida de Geppetto, fazendo este se tornar num bêbado solitário, deixando de ser o tão louvado e respeitável carpinteiro que outrora fora, e acaba por encher a pequena vila italiana de pena dele pela tragédia que passou.

Um certo dia, como qualquer outro, Geppetto estava completamente bêbado e decidiu ir ao cemitério, neste momento num ato de devaneio, loucura e desespero, decide cortar uma jovem árvore que estava presente naquele local, contudo, esta estava a ser habitada por um pequeno grilo, chamado Sebastian (Ewan McGregor), que acorda sobressaltado com a destruição do carpinteiro, com receio decide não sair do seu pequeno tronco e acaba por ser levado sem intenção para casa de Geppetto, onde este ia tentar recriar aquele que seria o seu filho.

Após uma noite de trabalho árduo, o carpinteiro já não aguenta da bebedeira e numa mistura de embriaguez e cansaço, este decide ir descansar. Contudo, durante a sua “aventura” no cemitério Geppetto estava a ser observado por umas pequenas criaturas (que eram almas que estariam a fazer a travessia para o outro lado), que o seguiram até casa, e assim que este se foi deitar, as criaturas formaram um espírito da floresta (também conhecida nos contos como Fada Azul – interpretada por Tilda Swinton) que ostenta asas imponentes adornadas com olhos, que ao ver toda a tristeza de Geppetto, fica sensibilizada da vida trágica e solitária que este leva, e não consegue ficar indiferente, já que este era um bom homem. Assim esta criatura mística decide dar vida ao pequeno boneco de madeira, mas também incumbe Sebastian de o guiar e fazer de Pinocchio um bom menino.

Quando o carpinteiro acorda dá de caras com a sua criação viva, a correr pela sua casa. Porém ele não tem muito tempo a perder, pois está na hora da missa então ele instruí Pinocchio (Gregory Mann) a ficar em casa. Mas, o boneco de madeira não obedece e decide ir atrás do seu pai, e assim parte na aventura de conhecer o Mundo, ou melhor a pequena aldeia. Ao chegar à igreja o boneco cria o caos e a desordem, piorando a situação ao ridicularizar e brincar a posição de Jesus na cruz danificado que Geppetto ficou de reparar e concluir aos anos. Sem maldade, Pinocchio acaba por profanar a religião que os aldeões seguem, e estes acabam por condenar Geppetto e a sua obra como algo demoníaco.

Após uma longa conversa entre Geppetto, o padre da aldeia (Burn Gorman) e Podesta (Ron Perlman), um fascista governamental, querem que este estude e seja educado como qualquer outra criança. No entanto, Pinocchio à primeira oportunidade acaba por “rejeitar” a escola em prol da diversão do circo de marionetas, onde se torna a estrela do circo. Assim que Geppetto conhece esta faceta da pequena marioneta, decide ir buscá-lo e na discussão entre os dois, Pinocchio acaba por ser atropelado e morrer. Contudo, o pequeno rapaz de madeira é “imortal”, pois não sendo um menino de verdade, ele não pode morrer, apenas fica no limbo, controlado pela Morte (irmã do espírito da floresta – novamente interpretado por Tilda Swinton) por um determinado tempo e volta a acordar.

No entanto, neste momento o mundo está a passar pela Segunda Guerra Mundial, muitos vêm em Pinocchio um oportunidade única em que poderão vencer a guerra, pois o pequeno boneco de madeira é “imortal”, outros apenas querem fazer dinheiro com a marioneta falante, e Geppetto a única coisa que quer é o amor do seu filho, Pinocchio uma criança ainda, acaba por estar dividida no que quer para si, pois por um lado tem muita diversão e pouco amor, por outro lado é visto como um substituto e pode ser amado, e tem de aprender a lidar com todas estas personalidades todas. Pinocchio apenas vê uma solução fugir e viver a vida, mas, estará o menino de madeira a salvo dos que o querem mal? Ou acabará por ser aliciado por aqueles que o rodeiam e deixando escapar aquilo que fez com que existisse, o amor??

A Alegria pode ser Terrível…

Como era de se esperar, o diretor de filmes tais como Nightmare Alley, Pan’s Labyrinth e The Devil’s Backbone imaginou a estória infantil de Carlo Collodi como um espetáculo de “terror” estranhamente belo. Talvez ainda mais do que o aterrorizante Pinocchio de 1940 da Disney, esta variação em stop-motion co-dirigida por del Toro e pelo o animador Mark Gustafson debruça-se para os aspetos e temas mais enervantes dum boneco de madeira que ganhou vida, enquanto, ainda em simultâneo captura a maravilha do conto de fadas que toca nos corações de todos.

Del Toro, acaba por dar uma nova vida a Pinocchio, com a sua reinterpretação única de uma estória que todos conhecemos, porém, e já conhecendo o trabalho de Del Toro, este implementou ainda mais complexidade, não só à estória como a todas as personagens por ela envolvidas. Pinocchio, não é apenas um menino de madeira que quer ser real, ele é muito mais do isso, ele acaba por encarnar todos os sentimentos e emoções de ser diferente, além disso demonstra toda a ingenuidade de ser criança, e nesta adaptação o grilo falante Sebastian, não é o ajuda ou é tão útil como noutros contos, pois este apenas o faz (inicialmente) por interesse próprio.

O design e acima de tudo o detalhe desta animação são únicos, fazendo deste o melhor filme em stop-motion dos últimos anos. Tudo ganha vida com uma veracidade tátil que só a animação stop-motion pode proporcionar. O boneco de madeira possui sulcos profundos, as pinhas detalhes estrondosos e os tamancos de madeira tem curvas suaves. Estes e outros pormenores, fazem com que tenhamos através da visão a sensação táctil dos diferentes materiais. Porém, “não há bela sem senão”, pois um dos aspetos estranhos a nível visual é de todas as personagens envelheceram com o tempo, com a exceção de Geppetto, além do ritmo da narrativa por vezes não estar sincronizado com a evolução da estória, tornando alguns momentos menos marcantes.

Para enriquecer ainda mais esta experiência visual, esta animação possui uma banda sonora soberba, que nos atinge a cada sentimento e momento vivido, quer por Pinocchio, quer por Geppetto. O trabalho de voz realizado pelos atores de forma geral é magnífico, destacando-se o trabalho de Ewan McGregor, como o grilo falante que tenta aconselhar Pinocchio.

Em suma, esta animação é uma releitura do famoso conto de fadas italiano de Carlo Collodi, sobre um boneco de madeira que ganha vida e sonha em se tornar um menino de verdade, durante a Itália fascista dos anos 1930. Quando Pinocchio ganha vida, ele não é um bom menino, mas, ao contrário, faz travessuras deixando o seu pai o Mestre Geppetto sempre em sobressalto. Mas, em sua essência, Pinocchio é “uma estória de amor e desobediência”, pois Pinocchio luta para corresponder às expectativas do seu pai, aprendendo o verdadeiro significado da vida e do amor. A narrativa nada é mais do que algo que já conhecemos, mas desta vez trazida pela mente de Guillermo Del Toro, contudo, Toro quer dar destaque a todas as personagens, e é aqui que está o principal ponto menos positivo deste filme, pois ao querer dar este destaque, ele necessita envolver muitas estórias paralelas, que por momentos não encaixam ou estão dessincronizadas em relação ao conto principal.

Durante os 114 minutos de filme podemos observar um trabalho soberbo a nível de voz, imagem e som, contudo, a duração acaba também por ser algo pesado, assim como o ritmo da narrativa por vezes dessincronizado com a evolução da estória. Nesta animação é possível verificar que Toro mantém alguns elementos das versões anteriores desta estória, enquanto ajusta outros. E se nas variações anteriores estás estão mais preocupadas com a ideia existencial da vida dum “menino de verdade” e o que devemos fazer para merecê-la, em Pinocchio del Toro pensa mais na mortalidade e na vida, e como estas se completam e podem ser uma “alegria terrível”.

Partilhamos, convosco o trailer da reinvenção no cinema de Pinocchio de Guillermo del Toro

8.0
Score

Pros

  • Stop-Motion genial (melhor animação em stop-motion dos últimos anos)
  • Design, caracterização e detalhes das personagens
  • Cenários são simplesmente de encher o olho
  • Banda sonora soberba
  • Interpretação de voz dos atores magnifica
  • A reinterpretação de Pinocchio pela mente de Guillermo del Toro é algo único
  • Todas as personagens têm destaque

Cons

  • O destaque de todas as personagens levam por vezes a uma narrativa desequilibrada, e dessincronizada em relação ao conto principal
  • A ausência de envelhecimento de apenas Geppetto em 30 anos
  • Duração do filme

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