Análises, Cinema

The Banshees of Inisherin – Análise

The Banshees of Inisherin é uma tragicomédia dirigido, escrito e co-produzido por Martin McDonagh (dramaturgo, argumentista, produtor e diretor britânico-irlandês conhecido pelo seu humor negro, bem patente no seu trabalho, como por exemplo em In Bruges, Seven Psychopaths, Three Billboards Outside Ebbing, Missouri, etc.). Curiosamente, a CaixaNerd teve um acesso antecipado a este filme, e tivemos o privilégio de assistir à sua antestreia.

O núcleo principal é constituído por poucos atores, porém com alguns bem conhecidos do público em geral, como Colin Farrell (ator irlandês, que participou possui um vasto trabalho no Mundo do cinema, tendo participado em Minority Report, Bullseye, Alexander, Miami Vice, Cassandra’s Dream, In Bruges, Seven Psychopaths, Fantastic Beasts and Where to Find Them, The Batman, entre outros) e Brendan Gleeson (ator e diretor de cinema irlandês, sendo considerado um dos maiores atores de cinema da Irlanda. É mais conhecido pelo seu trabalho em Braveheart, Gangs of New York, Cold Mountain, Beowulf, In Bruges, The Guard, Calvary, Frankie, etc., mas também interpretou o icónico Professor Alastor “Mad-Eye” Moody na franquia de Harry Potter). Destaca-se também a participação de Kerry Condon (atriz irlandesa mais conhecida pela sua participação em na franquia cinematográfica da Marvel Cinematic Universe dando a voz a Friday, Dreamland, Gold, Dom Hemingway, The Runway, Unleashed, etc.) e Barry Keoghan (ator irlandês tendo participado em The Batman, Eternals, Dunkirk, Mammal, American Animals, entre outros.).

A Guerra…

O filme inicia no final da Guerra Civil Irlandesa em 1923, numa fictícia ilha irlandesa de Inisherin. No lado da ilha mais calmo, seguimos de perto o protagonista Pádraic Súilleabháin (Colin Farrell) na sua rotina de vida normal, fazendo o pasto dos seus animais, indo até ao pub da zona, onde fica a beber umas cervejas com os amigos, voltando a casa onde passa algum tempo com a sua irmã Siobhán (Kerry Condon), passando para um novo dia, e a rotina instala-se na vida pacata de Pádraic.

Os habitantes desta pequena ilha remota, acabam por ficar “presos” às suas rotinas e não se aventuram por novos “descobrimentos”, muito devido à guerra instalada do outro lado da ilha, mas também devido ao sentimento de conformidade que têm, e aparentam gostar da vida que levam. Contudo, um dia o melhor amigo de Pádraic, Colm Doherty (Brendan Gleeson), subitamente começa-o a ignorar afirmando que ele é desinteressante e que talvez já não são amigos. Esta rutura leva a uma estranheza nos restantes aldeões, pois sendo uma sociedade muito pequena e todos se conhecem, quando os dois não andam juntos, é o suficiente para gerar burburinho por toda a ilha.

Perante esta situação o Pádraic, que é um homem de rotinas, e que todo o seu dia-a-dia depende da rotina, fica muito incomodado e desolado, pois a partir de uma determinada onde ia juntamente com o seu amigo ao pub ou ficavam a conversar durantes horas, sente-se incompleto e não consegue viver calmamente com este sentimento, pois vê Colm a confraternizar com os restantes aldeões e mostrando-se feliz ao o fazer. Contudo, Pádraic fica cada vez mais aborrecido e “furioso” com esta quebra da amizade sem razão aparente.

Esta rutura entre os dois amigos permitiu a Colm apreciar outros momentos da vida, como se dedicar à música folk tradicional da região, fazendo quase como um paralelismo com a Siobhán que enquanto Pádraic não está por casa, esta dedica o seu tempo à leitura. Porém, é esta saída da rotina que permite a Colm retirar o prazer da vida, mas Pádraic não o vê como tal, e afirma que deve ter feito algo para que Colm esteja chateado com ele, talvez num momento em que o mesmo não estivesse sóbrio.

Assim sendo, o protagonista vê em Dominic (Barry Keoghan) um jovem da ilha que apresenta algumas limitações mentais, um novo amigo, mas sem nunca substituir o velho amigo, e os dois começam a relacionar-se cada vez mais, partilhando histórias de vida, tornando cada vez mais próximos. Dominic tem a perseverança de se tornar um homem aos olhos das mulheres e quem sabe formar família, contudo, o jovem tem um lado obscuro, pois conforme Pádraic vai conhecendo melhor Dominic, este apercebe-se que o jovem é jovem vítima de violência e abusos por parte do seu pai, que é o chefe da polícia da ilha Peadar.

Dominic, apesar das suas limitações intelectuais, tenta aconselhar Pádraic sobre a situação com Colm, mas Pádraic, demonstra-se cada mais desestabilizado com quebra da amizade e não sabe lidar com a perda de um dos seus poucos amigos, ficando, ao longo do tempo, cada vez mais angustiado e deprimido com a rejeição. Perante as inúmeras tentativas de aproximação de Pádraic a Colm este torna-se cada vez mais resistente, decidindo tomar medidas radicais e chocantes de forma a que Pádraic o deixe de importunar.

No meio destas situações “caricatas”, uma das aldeãs mais antigas, avisa o nosso protagonista do caminho que está a percorrer, e que “prevê” que algo vá correr mal, pois nestas situações é a morte que se avizinha. Ignorando este concelho Pádraic decide traçar o seu próprio caminho e engenha mil e uma formas de tentar reaver a amizade, por outro lado, a sua irmã Siobhán recebe uma notícia que a deixa inquieta, não só a ela como a toda a comunidade, que já vai falando nas suas costas.

No meio destas situações “caricatas”, uma das aldeãs mais antigas, avisa o nosso protagonista do caminho que está a percorrer, e que “prevê” que algo vá correr mal, pois nestas situações é a morte que se avizinha. Ignorando este concelho Pádraic decide traçar o seu próprio caminho e engenha mil e uma formas de tentar reaver a amizade, por outro lado, a sua irmã Siobhán recebe uma notícia que a deixa inquieta, não só a ela como a toda a comunidade, que já vai falando nas suas costas.

Com a crescente tensão entre Pádraic e o seu velho amigo, a pressão que os habitantes fazem a Pádraic, mas também a Siobhán, para que esta apoie o seu irmão e em simultâneo o tente conter a mente “criativa” que Pádraic possa ter, configura-se num cenário cada vez mais negro. Siobhán vê que os seus esforços não surtem efeito, e Pádraic acaba por perder a cabeça e querer confrontar Colm uma vez por todas. Siobhán e Dominic tentam impedir que o nosso protagonista que siga num caminho mais obscuro e sem regresso, mas, o mesmo tem algo a dizer não se importando com o que outros possam pensar. Esta poderá ser o último ataque da Pádraic para reaver uma amizade que se encontra perdida e com poucas esperanças, mas na verdade tudo depende do respeito e do que estes 2 personagens querem verdadeiramente.

A Ilha…

The Banshees of Inisherin, conta-nos uma estória que se passa no século passado numa ilha remota na costa oeste da Irlanda, sobre dois amigos de longa data encontram-se num impasse porque um deles decide terminar abruptamente o seu relacionamento, o que traz consequências alarmantes para ambos, tudo isto numa altura crítica onde a guerra civil na Irlanda ainda estava instalada. Nesta longa-metragem, a visão do diretor Martin McDonagh é exatamente mostrar como a rotina, a monotonia e a solidão têm um enorme impacto, não apenas nos diversos ilhéus da sua narrativa, mas mais objetivamente no mundo em que habitamos. À semelhança com o que este realizador nos mostrou em Three Billboards Outside Ebbing, Missouri, McDonagh demonstra de forma muito crua a natureza do ser humano, e como uma pequena diferença de ideias pode gerar o maior conflito que estes dois amigos poderiam atravessar. Pois, apesar de ambos terem os seus vícios, e as suas rotinas, um é demasiado dependente destas rotinas (e uma pequena mudança é o suficiente para entrar em colapso), além de apresentar uma enorme necessidade de atenção, mas também necessitar da aceitação e como os outros o vêem, o outro, já está farto de rotinas, e tem uma necessidade tremenda para criar situações que o levam a sair da rotina, além de mostrar prazer nestas suas criações, o que leva a um ponto central desta personagem que é o egoísmo. The Banshees of Inisherin é uma embarcação robusta para essa exploração temática – ambientada num lugar tão pitoresco, mas decadente, povoado por almas perdidas em vários graus. A versão de McDonagh da Irlanda isolada pode ser um pouco condescendente, uma farsa rural que é mais sarcástica do que doce. Mas The Banshees é equilibrado por uma decência, uma sensibilidade, que com alguns dos estereótipos folclóricos.

A narrativa possui um ritmo não harmonizado e inadequado, sendo muito lento no início, quase mostrando a jornada e a rotina dia após dia, enquanto o final possui um ritmo muito célere não deixando o espectador apreciar o clímax de forma adequada, podendo levar a algumas interpretações inadequadas por parte dos mais desatentos. Contudo, e apesar de este ser um ponto menos positivo a nível técnico desta longa-metragem, é algo inerente à própria mensagem que nos é passada, ou seja, demonstrar este tipo de rotina, para que o espectador sinta um pouco desta experiência, observando mais minuciosamente estes pormenores, The Banshees of Inisherin está repleto de simbologia e analogias, por isso este mesmo ponto é algo que caracteriza muito bem todo o desenlace da narrativa e do filme.

Continuando ainda dentro da narrativa, a estória desta longa-metragem apresenta-nos uma comédia negra, repleta de alívios cómicos acutilantes e sarcásticos, sobre o orgulho masculino tóxico, sentimentos masculinos feridos, a solidão, a morte, a agressão e chegando mesmo à automutilação. No entanto, é possível gerar risadas genuínas ao longo do filme, mas cada uma delas encaixa-se no lamento da dor, pois os vários momentos cómicos, têm um propósito, ou seja, as piadas são cuidadosamente pensadas em momentos chave, e genuinamente boas, mas sempre com um propósito associado, que é sair da rotina do filme, ou seja, “esconder” a verdadeira imagem do filme e disfarçar o peso e as partes obscuras.

Nos restantes pormenores técnicos, não há palavras para descrever a qualidade que nos é apresentada, os cenários são incríveis, mostrando e representado elegantemente bem a solidão destas regiões (que existem quase em qualquer país), os planos abertos para mostrar a distância entre habitações, mas também a distância entre pessoas, é soberba, no entanto estes mesmo planos fecham-se rapidamente, nos momentos mais pessoais ou das conversas de “cusquice” demonstrando que apesar da existência física que existe, todos se conhecem e todos sabem perfeitamente da vida uns dos outros. O detalhe da edição e mistura de som é brilhantemente bem adequado ao filme, sente-se cada chilrear de um pássaro, ou no meio da confusão as ondulações do mar. A banda sonora também é algo que enaltece esta obra, já que nos apresenta temas tradicionais irlandeses.

As interpretações de forma geral são executadas de forma magnífica, mas na verdade o destaque é todo de Brendan Gleeson que entrega-nos uma personagem forte e recheado de presença, mesmo não sendo o protagonista, Colin Farrell e Barry Keoghan não ficam atrás desta interpretação, e apresentando representações fenomenais. Os 3 atores elevam a qualidade deste filme, com papéis emocionantes e cativantes, conseguindo transmitir brilhantemente as emoções, sentimentos e até pensamentos das suas personagens sem ser através da fala, com simples olhares e traquejos.

Em suma, The Banshees of Inisherin é um filme pitoresco e peculiar, melancólico e distintamente irlandês, situado no início da década de 1920, enquanto a Guerra Civil Irlandesa que se alastra na principal ilha do país, porém em Inisherin paralelamente há um “guerra” devido a uma amizade que terminou. É curioso observar estes dois homens rudes a discutir algo tão delicado quanto sentimentos feridos e amizade. Ao longo desta longa-metragem ocorrem diversos momentos sombrios e tristes, mas também engraçados de forma indireta, sendo demonstrado o quão profunda é a dor e a confusão no coração de ambos protagonistas. The Banshees of Inisherin é uma obra magnifica, que combina extremamente bem a tragédia, o drama e a comédia, é impossível não nos rirmos das diversas cenas apresentadas, mas o contrário também é verdade, é igualmente impossível não sermos tocados emocionalmente pelo lado negro desta trama. Tudo isto é partilhado de forma brilhante através da cinematografia repleta de belas cenas rurais irlandesas estilizadas, bucólicas e irônicas e da sonografia cheia de homenagens à música popular irlandesa e às sonoridades típicas do meio rural. As interpretações são majestosas e o espectador não fica indiferente a nenhuma delas, mas o maior destaque, tal como mencionado anteriormente vai para Brendan Gleeson e é um prazer ver a química de Farrell e de Gleason, além que ambos tem uma performance comovente e intrincada. Destaca-se também o desempenho de Barry Keoghan, que carrega um monte de idiossincrasia, através da sua excelente interpretação de um jovem limitado e confuso. The Banshees of Inisherin sussurra, lamenta e diverte em simultâneo e oferece a oportunidade inestimável de ver os conflitos emocionais relativos à rotina, monotonia, solidão e violência.

Podemos afirmar, que este é sem dúvida um dos filmes do ano, merece todo o protagonismo que está a ter, assim como as suas premiações, contudo acredito que esta estória ou a forma como a narrativa caminha não cative toda a gente.

Partilhamos, convosco o trailer do filme que tivemos oportunidade de ver em antestria The Banshees of Inisherin

8.0
Score

Pros

  • Combinação de tragédia, drama e comédia excelentes
  • Direção brilhante
  • Cinematografia e cenários
  • Interpretação do elenco (com maior destaque para Brendan Gleeson)
  • Sonografia
  • Banda sonora

Cons

  • Ritmo da narrativa desequilibrado (mas adequada à mensagem do filme)

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