Análises, Jogos

Dakar Desert Rally (Análise)

O Dakar já começou, e com ele foi lançado um novo título da Saber Porto relacionado com o mesmo, o “Dakar Desert Rally”. O sucessor do “Dakar 2018” tem, obviamente, mão portuguesa e conta com novos cenários, novos carros e muito mais conteúdo para ser explorado. Sim, “explorado” é o termos mais correto, visto que exploração é o que não falta neste jogo.

Antes de começar a análise, devo referir imediatamente que a redação da Caixa Nerd já teve a feliz oportunidade de entrevistar a equipa da Saber Porto, na figura da Andreia Mendes, acerca deste jogo. Podem ler esse artigo em Falámos com a Saber Porto sobre o Dakar! – Caixa Nerd.

Vamos então para a análise.

A especialidade da Saber Porto é a maestria no Design de Dakar Desert Rally

Se há uma coisa que ninguém pode negar é que a Saber Porto é mestre em modelagem 3D. E este jogo não é exceção. O jogo está incrivelmente bonito. Atrevo-me a dizer que é o jogo de corrida mais bonito dos últimos tempos. Os cenários estão muito bem concebidos, com uma paleta de cores estonteante e paisagens de cortar a respiração, os veículos estão incrivelmente bem detalhados, os jogos de luzes, as texturas da areia e da água. Tudo está simplesmente impecável.

Os menus são bonitos e organizados, tantos os menus rápidos, como os principais e possuem uma estética, na minha opinião, bastante ligada ao jogo.

Mas não foi só na estética que o jogo foi bem feito.

Belíssimos ambientes em Dakar Desert Rally

Dakar não se resume a quem é mais rápido, mas sim à sua ambientação

Vou falar agora das características que deixam este título algo único.

O primeiro, a navegação. Este é o ponto positivo principal do jogo. Em “Dakar Desert Rally” a tua atenção resume-se a 45% a condução, 55% a navegação. É, de facto, um ponto de viragem dos jogos de corrida termos algo deste género, pois acrescenta uma dificuldade inusitada e uma noção de imersão do jogo bastante complexa. O jogo disponibiliza-nos todas as ferramentas que um real piloto de rally tem na sua posse: copiloto (quando possível, obviamente), a bússola e compasso de bordo e o roadbook. E todos são muito bem incorporados no jogo, especialmente o compasso e o roadbook.

Na minha opinião, o ponto mais fraco da navegação foi realmente o copiloto. Muitas vezes ele demorava bastante a dar indicações, especialmente se estivermos a conduzir em direção a um caminho errado. Essa demorava induzia em erro diversas vezes, pelo que às vezes preferia usar o roadbook que seguir as suas indicações. Outro ponto menos bom do copiloto é o facto de não ter voz portuguesa. Sendo um jogo criado com mão nacional e vendo as poucas linhas de fala do copiloto, não compreendo esta lacuna.

O segundo ponto acerca da ambientação que gostaria de referir é a alteração do clima ao longo da etapa. Senti que foi uma adição importante para a imersão do jogo, embora algumas vezes pareciam um pouco bruscas demais, dando uma noção de artificialidade que preferia não sentir. Este ponto peca por aí. Preferia algo mais natural, como acontece em jogos do género. Mas não é algo tão significativo.

Existem ainda outros elementos que melhoram essa imersão, como a implementação dos outros veículos na etapa, as regras de limite de velocidade ao pé de locais povoados (embora ache as penalizações um pouco leves demais) e toda a parte da modelagem anteriormente referida.

A imersão foi o melhor sentimento que tirei deste jogo. Pelo menos no visual e na mecânica de navegação. E a condução? Bem, a condução foi o calcanhar de Aquiles deste jogo.

A condução

Force Feedback

Para referência, para os carros, camiões e SXS, utilizei um Thrustmaster t150 (todo de origem), enquanto para as motos e quads, utilizei um comando de Xbox 360.

De facto denotei uma dificuldade da Saber em desenvolver um force feedback competente. Há pouca mudança de feeling entre um tipo de pavimento e outro, o feedback dos saltos é macio demais e a principal movimentação do volante com o feedback é o da torção da traseira que obriga a contra brecagem dos veículos.

Para quem não está tão dentro do assunto, o force feedback é a simulação produzida pelo jogo e traduzida para volantes capazes de o fazer. No meio competitivo de corridas, há dois tipos de jogadores, no que ao force feedback diz respeito. Há o jogador que gosta de ter uma simulação mais leve, sendo assim capaz de sentir o mínimo de feedback necessário para perceber as condições de tração e pavimento sem prejudicar a movimentação do volante de forma significativa, enquanto há um segundo tipo de jogadores, que prefere ter um feedback mais rígido em troco de uma maior força de viragem do volante e de resposta do feedback.

Eu situo-me no segundo tipo e, para ter o feeling que gosto de ter, senti-me obrigado a colocar a opção no máximo de força, algo que nunca tinha acontecido noutro jogo deste estilo.

Faltou experimentar o Audi!

Dificuldade e sensação de condução dos veículos de volante

Em todas as categorias (umas mais que outras, mas já lá vamos) nota-se uma pouca atenção às dificuldades de conduzir num ambiente tão atribulado como o Dakar, o que dá ao jogador um sentimento de imprudência enorme. “Não importa se estou próximo de um salto, não importa se o terreno x ou y é mais complicado de obter tração, não importa se estou ao pé de uma duna enorme. Posso sempre afundar o pé no acelerador que nada me acontecerá. Provavelmente não me vou despistar e, caso aconteça, os danos do carro não representam um grande entrave na minha condução.” foi o que eu senti durante toda a gameplay.

O comportamento dos veículos era demasiado previsível e demasiado fácil de dominar. A mecânica da suspensão era demasiado irrealista, quase como se fosse capaz de absorver qualquer defeito do terreno, qualquer abordagem arriscada do piloto. Vindo de quem tem alguma experiência em desenvolvimento e teste de suspensões, é difícil acreditar que as peças no Dakar tenham um poder de absorção tão astronómico e mantenham aquela resistência toda.

Também tem pontos positivos. Todos os estilos de condução são bastante divertidos, especialmente os SXS e os camiões. Nota-se bastante a diferença de massa entre uns e outros e as mudanças de mecânica entre eles. No camião, coloquei uma capacidade de rotação maior no meu volante e foi a melhor coisa que fiz. O maior número de voltas que o volante consegue produzir, juntamento com a gameplay pesada do camião, tornaram a categoria a mais desafiadora e empolgante de todas.

Moto 4 em Dakar Desert Rally

Dificuldade e sensação de condução nas motas

Partindo primeiro para as motos de 2 rodas. Este foi o modo mais difícil de todas as categorias (incluindo as

Estes foram os modos mais difíceis de todas as categorias. Nelas realmente tem-se noção a real vulnerabilidade dos pilotos e suas máquinas durante uma prova tão agressiva como um Dakar. A imprudência evidenciada nos parágrafos anteriores é consumida por um sentimento de solidão e medo quando entramos numa prova. Qualquer abordagem mal realizada é sinónimo de queda eminente.

Só achei que deveria existir alguma consequência física do piloto durante as quedas. Não estou a dizer que precisavam de mostrar o piloto magoado. Mas poderiam referir que ele estava lesionado e impedir o jogador de continuar a bateria de etapas, especialmente nos modos mais difíceis.

No que toca às motas de duas rodas, é muito difícil criar uma noção real do que é conduzir uma mota. Jogos como MotoGP, Ride, etc. são jogos que bem tentam criar essa noção, mas é extremamente difícil. A maioria dos amantes de motas dizem que não é fácil atribuir a sensação de conduzir uma moto, por causa das sensações na travagem, distribuição do peso do piloto, etc.

Penso que “Dakar Desert Rally” não esteve muito longe desses jogos no que toca ao realismo, no entanto, tratando-se de um jogo de Rally, pensei que houvesse uma maior atenção à distribuição de peso. Ela é feita automaticamente com a viragem da mota, mas julgo importante haver uma forma de a controlar, nem que seja para trás e para a frente, de forma mais fina. De resto, apenas tenho a apontar alguns problemas no que toca às quedas. Às vezes não conseguia compreender o algumas delas. Bastava às vezes subir uma duna de uma forma que, na minha visão seria simples, para provocar um acidente, e depois, num salto, realizar um salto bastante complicado e não cair, tornando a perigosidade um pouco imprevisível. Mas penso que não afeta muito a experiência.

No que toca às moto 4, não tenho grande coisa a apontar. Penso ter sido o tipo de veículo que achei mais realista (talvez faltasse apenas algum peso na viragem da moto).

Vamos agora falar dos veículos propriamente ditos.

Motos em Dakar Desert Rally

Veículos

Penso já ter feito perceber que gostei bastante da modelagem de todo o jogo, incluindo os veículos.

Em termos de variedade (possuindo veículos do Dakar 20, 21 e 22), parece-me o jogo oficial de uma prova mais completo de todos.

Em termos de qualitativos, o jogo tem altos e baixos.

Penso que é fácil perceber as diferenças entre modelos, algo bastante positivo num jogo de Rally, especialmente.

No entanto, sinto falta de uma possibilidade de afinação mais rigorosa dos carros, no que toca a elementos, como a travagem, suspensão, comportamento do chassis, eletrónica, etc. Alguns jogos do género, como Dirt Rally, F1 e o MotoGp possuem esse tipo de afinação mais completa e acho que é uma mais valia enorme nos jogos.

Faltou-nos experimentar o Audio E-Tron

Modos de jogo e Modos de Dificuldade

Os modos de jogos são, basicamente, o modo livre e o modo carreira. No modo carreira, adquire-se um primeiro veículo, faz-se etapas com ele, ganha-se pontos para se adquirir novos veículos e assim sucessivamente. No modo livre, escolhe-se um veículo, estando todos disponíveis e faz-se uma corrida com bots (apesar de dizer Online, só apanhei bots mesmo).

Com recurso à entrevista que fizemos, sabemos que outros modos serão adicionados, mas por agora são estes.

Sinceramente, não acho que seja necessário, por agora, novos modos, especialmente quando o principal foco tem de ser aperfeiçoar o que se tem, que não está a 100%. Só depois de se limar todas essas arestas é que se pode falar em abrir novos modos de jogo.

Quanto às dificuldades do próprio título. Existem três modos de jogo. O sport, o profissional e o simulação.

O sport é o mais casual, onde o jogo coloca vários NPC perto de ti e onde a orientação é praticamente anulada. Tens linhas guia para te orientares e o jogo guarda automaticamente depois de passares nos waypoints.

O profissional acaba com essas guias, apesar dos waypoints ainda gravarem o percurso. Ou seja, neste modo já se tem de ter especial atenção à orientação. Os NPCs já simulam a realidade neste modo, pelo que estão longe de ti.

O simulação é basicamente o anterior mas não existe auto-save e as regras do Dakar, como limites de velocidade geral da etapa, passam a ficar aplicados.

Eu joguei bastante o profissional, utilizei o sport para experimentar os veículos todos e joguei o suficiente para experimentar o simulação.

Viram o que se passou? Não falei de nada referente à condução, que não altera em absolutamente nada modo para modo. Sinto falta disso, pois a diferença entre a simulação e a casualidade, mesmo no Dakar, está também aí.

De resto, a diferença na orientação e de regras mudam completamente a experiência e está certo, mas a diferença precisa de mais.

Os modos de dificuldade

Conclusão final

É um jogo que me parece incompleto, tem alguns erros que devem ser tratados ou contornados.

No entanto, o jogo é bastante divertido, bonito e único. O facto é que não existe um jogo assim, um jogo sequer comparável (excluindo o seu antecessor). Existe jogos de condução, alguns deles com pequenos resquícios de orientação, mas nada como neste jogo.
O jogo ganha à maioria dos títulos do seu género em quantidade de veículos, modos diferentes de condução, mudança de biomas, cuidado no visual. Mas perde muito no que, para mim, realmente interessa, realismo físico, mecânico e de condução.

Agora vou falar um pouco de mim. Como alguns sabem, sou estudante deslocado (do Barreiro para Coimbra, baby). É fácil de se ter um sentimento grande de solidão, longe das raízes, da família, dos amigos de infância, de memórias. As únicas pessoas que podem tapar um pouco essa sensação são os teus colegas de faculdade. São neles que te agarras quando te sentes mais sozinho. Uma das formas de eu fazer isso é jogando com os meus colegas de casa, Dinis e Pedro. Costumamos trocar boas experiências, conversas e gargalhadas enquanto competimos uns contra os outros em variados jogos de corridas, porque todos amamos carros. Mas com “Dakar: Desert Rally” foi diferente. Desta vez, demos por nós, juntos, a batalhar para nos ajudarmos. Enquanto um conduzia, o outro lia o roadbook, como se de um verdadeiro copiloto se tratasse e o outro ainda mandava uns bitaites sobre o CAP e a bússola.

É verdade que um jogo é a jogabilidade, a arte, a realização e programação, mas sobretudo é diversão. E acreditem, este jogo é bastante, mas bastante divertido. Ou seja, mesmo com os seus defeitos que não tiram, para mim, o selo de mediano ao título, é um jogo que recomendo vivamente e que dificilmente sairá da minha memória e do meu PC, para conseguir experienciar esses momentos.

Obrigado à Saber Porto por nos ter disponibilizado uma cópia do jogo e pelo tempo que despenderam para o nosso trabalho.

Related posts